domingo, 9 de fevereiro de 2014

II. Os almoxarifes do Paço Real da Ribeira de Muge – nos 500 anos da conclusão do Paço Real da Ribeira de Muge

Sendo este ano aquele em que se comemoram os 500 anos da conclusão da edificação do Paço Real da Ribeira de Muge, apresentamos hoje o segundo de doze temas relativos a este. Sobretudo para lembrar os 500 anos da nomeação do primeiro almoxarife, trazemos hoje não o desfilar e dissecar da nomeação dos vários homens que ocuparam o cargo – isso já foi feito, e bem, por Vasconcellos (1926) e Evangelista (2011) – mas antes um sublinhar de alguns aspetos, olhados de forma transversal ao longo dos anos em que o almoxarifado esteve em funcionamento.

O almoxarifado no Paço Real da Ribeira de Muge foi criado a 9 de Fevereiro de 1514, sendo nomeado almoxarife Diogo Rodrigues. Este já exercia essa atividade, como almoxarife das obras, que se desenrolaram desde 1511 até 1514. Na tabela abaixo encontramos a cronologia daqueles que exerceram a atividade, e em que anos foram nomeados:


As funções do almoxarife, no caso específico do Paço Real da Ribeira de Muge, “mais do que o guarda dos paços e do pavilhão de caça, era o funcionário da fazenda que percebia os rendimentos do paul” (Beirante apud Evangelista, 2011: 109). Quer isto dizer que as pessoas que habitavam as charnecas e cercanias do paço, eram aqui que vinham pagar as rendas e impostos devidos ao monarca. Para além disto, é referido que é necessário que os almoxarifes façam a guarda dos paços e pavilhão de caça. Ora precisamente, em quase todas as nomeações de almoxarifes, na descrição do vencimento, é referido que estes ganhariam dois moios de cevada anual, com objetivo de manter um cavalo para guarda da coutada.

Pórtico do Paço, com capela no interior. Vista em 2009.

Falando precisamente nos vencimentos, este é um outro aspeto curioso. Para além dos referidos dois moios de cevada, os almoxarifes recebiam ainda dois moios de trigo, “para seu mantimento”, ou seja, para os seus gastos pessoais. Além destes, recebiam ainda uma quantia de dinheiro, que foi aumentando ao longo dos anos. Com efeito, Diogo Rodrigues começou por receber 5$000, sendo ainda possível que passasse a receber 8$000. Em 1527, cinco anos depois de estar a exercer o cargo, Luís da Mota é aumento dos ditos 8$000 para 10$000. Este valor manter-se-á durante mais de dois séculos, não obstante ao aumento em 1644 para 34$000, sendo apenas os 10$000 para mantimento do almoxarife, e os 24$000 para pagar a um homem que andaria sempre nos pomares do paço, passando a dois homens (pelo mesmo valor) com a nomeação de Jorge Peixoto da Silva, em 1667. Este cenário só se alterará em 1769, com a nomeação do último almoxarife, Paulo Soares da Mota (II). Este receberia 40$000, tendo de ter à sua conta os dois homens referidos.

O ofício de almoxarife (tal como muitos ofícios à época) era hereditário. Com efeito, é frequente encontrar nas cartas de nomeação que o cargo tinha vagado por morte do anterior (é o caso de Luís da Mota, Estevão Peixoto, entre outros). Por outro lado, é também comum que o ofício passe de pai para filho ou para genro. Abaixo surge uma sequência genealógica de parte dos almoxarifes.



Após os dois primeiros almoxarifes entramos nesta, digamos, “dinâmica” de herança do ofício. Contudo, após João Rodel Figueira, o ofício foi extinto (não sabemos se aquando da sua morte, se antes disso), sendo posteriormente reaberto e nomeado Francisco de Almeida, monteiro, para o cargo. Este recebia apenas um moio de trigo e outro de cevada (além dos 10$000+24$000), recebendo o outro moio de trigo e de cevada a viúva de João Rodel Figueira. Com a morte de Francisco Almeida, é nomeado para o cargo o filho de João Rodel Figueira, Jorge Peixoto da Silva.

Quando Jorge Peixoto da Silva morre, o seu filho, que lhe sucederia no ofício, é menor. Assim, irá suceder no cargo de almoxarife dos “Paços dos Negros da Ribeira de Muge” José Soares da Mota, que terá de dar metade do ordenado a D. Francisca Moura, viúva. No entanto, José Soares da Mota morre antes de Filipe Peixoto da Silva atingir a maioridade. Assim, ficará o seu filho, Paulo Soares da Mota (I) a ocupar o cargo. Contudo, Filipe Peixoto da Silva desistiu do cargo, e Paulo Soares da Mota (I) irá tomá-lo com carácter definitivo, passando posteriormente para o seu filho (João de Seixas Henriques) e depois neto (Paulo Soares da Mota II), que será o último almoxarife do paço.

Vista da zona do Pomar para o interior do Paço, em 2009.

Um outro aspeto digno de nota prende-se com a diferença entre a data de nomeação para o cargo e o exercício efetivo deste. Com efeito, poderia o almoxarife começar a exercer a função antes de ser nomeado pelo monarca. Foi o caso de Estevão Peixoto, que apesar de ser nomeado a 30 de Setembro de 1546, já o exercia desde 3 de Agosto de 1545, quando morre o seu sogro, Luís da Mota, tendo decorrido um ano até à nomeação.

No final do séc. XVIII, o paço sai da posse da Coroa. O almoxarife passará a ter apenas a capela a seu cargo. Evangelista (2011), refere que este era ocupado em 1801 por João Evaristo de Sá e Seixas, com um ordenado de 40$000.

Bibliografia:
EVANGELISTA, Manuel (2011). Paço dos Negros da Ribeira de Muge: A Tacubis Romana. S/l: Edição do autor.

VASCONCELLOS, Frazão de (1926). “O Paço dos Negros da Ribeira de Muge e os seus almoxarifes”, separata da publicação Brasões e Genealogias. Lisboa: Tipografia do Comércio.

http://embuscadopatrimonio.blogspot.pt/2014/04/contemplo-estas-ruinas-seculares-restos.html#gpluscomments
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