quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Diogo Vieira e Maria Nunes, um casal de moleiros?

Tendo por base o “Livro dos defuntos, dos baptizados e dos casados” da Freguesia de Santo António da Raposa, no período que medeia 1706-1741, ou seja, a quase totalidade da primeira metade do séc. XVIII, encontramos referência a uma série de indivíduos que aqui viviam, e que cuja constante repetição nos registos, sobretudo como “padrinhos” ou “testemunhas”. Hoje iremos deter-nos num casal: Diogo Vieira e Maria Nunes.  
Esquema genealógico de Diogo Vieira, construído através da tecnologia "My Heritage", com base nos assentos paroquiais. 

Diogo Vieira e Maria Nunes foram pais de seis crianças. De algumas temos o registo de óbito, doutros o de nascimento. Apenas de uma das filhas, Mariana (a segunda que teve com este nome), temos o assento de batismo e óbito. De destacar também o seu filho Martinho, que apesar de termos apenas o assento de óbito, (de 25 de novembro de 1736), neste vem mencionado que morreu com cerca de dois anos, pelo que poderemos deduzir que terá nascido em 1734. Dos seus filhos, apenas Maria, nascida em 1717, não temos assento de óbito. Terá chegado à idade adulta? Diogo Vieira irá morrer em a 8 de novembro de 1738, no Moinho da Raposa. Maria Nunes, voltará a casar, alguns meses depois, com Jorge Coelho, natural de Malaqueijo (atualmente pertencente ao concelho de Rio Maior). 

Para além destes assentos, que nos permitem reconstituir um pouco a vida familiar deste casal, existem vários outros, que nos permitem reconstituir um pouco da sua influência social. Com efeito, Diogo Vieira é testemunha em 10 casamentos (no total de 79 que abarca o período do livro em questão). O casal é padrinho de oito crianças e Maria Nunes é madrinha, sem o marido, de mais três crianças.

Em relação aos casamentos, poderá justificar-se um tão grande “apadrinhamento” de Diogo Vieira pelo facto de saber assinar, e possivelmente ser das poucas pessoas que o sabia fazer na altura? Seria obrigatório que as testemunhas de casamento soubessem assinar? Quanto aos batismos, mais do que analisar de quem foi padrinho (e não o foi de dois irmãos – todos os seus afilhados têm origens diversas), poderemos ver a sua importância por quem foi padrinho dos seus filhos. Com efeito, da sua filha Mariana, batizada em 1720 foram padrinhos o próprio Pároco, o padre Pedro de Barros, juntamente com Leonarda Maria, de quem falamos aqui. Aliás, Leonarda Maria já houvera sido madrinha em 1717 da sua filha Maria. As relações entre o casal Diogo Vieira e Maria Nunes e a família de Leonarda Maria não eram unidirecionais, uma vez que Maria Nunes foi madrinha em 1714 de Manuel, filho de Leonarda Maria, e Diogo Vieira será testemunha de casamento de um outro filho de Leonarda, José Marques. Qual o vínculo entre estas duas famílias? Diogo Vieira e Maria Nunes foram moradores no Moinho da Ponte Velha entre 1713 e 1720 pelo menos. Moinho este que pertencia a Leonarda Maria. Cremos poder afirmar que a relação ia além do “patrões-empregados”, mas até onde, não o sabemos.

Cabe ainda referência a um outro assento de óbito digno de nota. Trata-se do filho de Gesuína de Jesus, uma mãe solteira, que vivia em casa de Diogo Vieira, segundo o que diz o assento. Seria uma criada ou uma familiar?
Moinho da Ponte Velha, em 2010.

Quanto aos locais em que viveram Diogo Vieira e Maria Nunes, em 29 assentos, doze mencionam o local onde viviam. Se entre 1713-1720 viveram no Moinho da Ponte Velha (ainda que exista um registo que alude simplesmente à Ponte Velha), de 1721 até à morte de Diogo Vieira (1738), viveram no Moinho da Raposa, ainda que surja em dois assentos (1727, 1728) simplesmente Raposa. Já no assento do segundo casamento de Maria Nunes, menciona que o casal houvera vivido no Moinho da Várzea Redonda (que curiosamente também era propriedade de Leonarda Maria).

Os erros dos párocos nestes assentos são frequentes. À distância de 300 anos, conseguimos encontrar alguns, pelo que muitos mais haverá. Será a ausência da designação de “moinho” um simples esquecimento do padre? E seria a referência ao Moinho da Várzea Redonda uma confusão com o Moinho da Ponte Velha, onde Diogo Vieira efetivamente viveu, por serem do mesmo proprietário?

Contudo, o facto principal e que mais salta à vista é o facto de Diogo Vieira e Maria Nunes terem vivido em moinhos. Seriam um casal de moleiros? Este é um facto que não nos deixa de intrigar, na medida em que a vida num moinho não seria confortável, visto que será sempre um sítio húmido, com muita poeira e barulhento. Pouco confortável e pouco salubre. Talvez apenas a profissionalização/especialização no ofício (que tinha regimentos vindos do século XVII) possa justificar esta residência sempre em moinhos.  

 Fonte:
(1706-1741). Livro dos defuntos, dos baptizados e dos casados – Raposa (Sto. António).


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