São
no total 37 os assentos que mencionam António Roiz e/ou Maria Cordeira. Apesar de
quando em vez os padres omitirem os locais onde viviam os seus paroquianos, por
28 vezes menciona onde esta família vivia, sendo aludidos ao longo dos anos
dois locais: o Moinho dos Gagos e o Moinho dos Passos dos Negros. O último
registo onde aparece o Moinho dos Gagos é de 3 de agosto de 1721, quando
António Roiz é testemunha de um casamento. O primeiro registo que o dá como
morador no Moinho dos Passos dos Negros é o do casamento da sua filha Juliana
Rodrigues, a 8 de junho de 1722.
Localização, assinalada a vermelho, do local aproximado
onde esteve edificado o “Moinho dos Passos dos Negros”, que António Roiz
comprou no início do séc. XVIII.
Sobre
esta mudança de residência, e tendo por fundo um documento da época da
chancelaria régia, sabemos que a 18 de novembro de 1719, perante o tabelião da
Vila de Almeirim foi feita uma escritura de compra do Moinho dos Passos dos
Negros, foreiro ao rei, a António Roiz. Este pertencia a D. Eufrásia de Moura e
Pestana, tinha como foro 30 alqueires de pão meado (15 de trigo e 15 de cevada)
e o moinho não se encontrava a trabalhar à época da venda. Esta venda foi feita
por 180 mil réis (*), mantendo-se o foro, que seria pago a 15 de agosto no
almoxarife das jugadas da Vila de Santarém. António Roiz pagou na hora em
moedas de duro, correntes à época.
Os
aforamentos eram usualmente feitos em três vidas. Ora, estando o moinho aforado
a D. Eufrásia, e sendo esta a primeira vida, quando o vende a António Roiz,
este passa a ser a segunda vida. Assim, por via da compra, este irá requerer em
março de 1720 que passe a ser contabilizada a sua vida como a primeira, podendo
ele nomear depois a segunda vida e essa a terceira. Em maio desse mesmo ano
é-lhe concedido o aforamento do Moinho dos Passos dos Negros em três vidas,
sendo a sua a primeira.
Posto
isto, podemos aqui entrever algum do poder económico que teria António Roiz.
Longe de poder ser considerado um pequeno burguês, seria contudo alguém
importante no contexto da sociedade que se vivia à época neste local. Com
efeito, comprou (**) um moinho que não estava a trabalhar (apesar do prédio
aforado conter outros elementos, como “árvores de fruto e sem fruto”.
Ainda
dentro do tema dos locais onde António Roiz e Maria Cordeira viveram, há uma
outra questão sobre a qual deveremos refletir. Com efeito, estes viveram em
dois moinhos. Seria António Roiz um “mestre moleiro”? Sabemos que ao longo do
séc. XVII existiram vários regimentos e revisões a estes do ofício de moleiro
do concelho de Santarém (do qual esta área fazia parte à época). Seria esta
profissão, que requeria alguns pressupostos, objeto da criação, não diremos de
uma elite, mas de alguns que conseguiam estar um pouco melhor na vida em
relação aos outros? Não devemos esquecer que o moinho é o meio através do qual
se obtém o pão, isto é, enquanto todos podiam cultivar os cereais, apenas no
moinho é que estes teriam alguma utilidade, depois do processo da moagem. Logo,
seria de importância vital para a sociedade.
(*) Para termos uma ideia da comparação dos preços, um
hectolitro (100 litros) de trigo em 1719, no concelho de Santarém, custava
cerca de 1$460, enquanto que a cevada se cifrava em cerca de 0$990 réis /
hectolitro. Já uma mó de dois palmos e meio, em 1735 no concelho da Moita, custava
2$400 réis. (Ventura 2007)
(**) o foro é visto mais como um imposto do que uma
renda, uma vez que o aforamento ultrapassa largamente o período de vida de um
indivíduo (pode ser em fatiota perpétuo ou por três vidas), e assim compensará
inserir melhorias no terreno, seja com a plantação de árvores ou a construção
de edifícios, uma vez que terá garantido tempo de vida útil para amortizar o
investimento. Tanto mais que o aforador estava autorizado a vender ou alugar o
terreno de que dispunha.
Fontes:
(1706-1741). Livro dos defuntos, dos baptizados e dos
casados – Raposa (Sto. António).
(1722).
“António Roiz Carta de Confirmação de Emprazamento”, Chancelaria de D. João V, livro 63, fol. 97 a 103.
VENTURA, António
Gonçalves (2007). A “Banda D’Além” e a
Cidade de Lisboa durante o Antigo Regime: uma perspectiva de histórica
económica e regional comparada. Dissertação de Doutoramento apresentada à
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
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